quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Desafio: Infância... (2)


Das Ausências dos vivos…

"A dor de ter um pai para quem estou morta estando viva, é muito maior do que a dor de fisicamente o perder.”
Março 2013
 
O meu pai era o meu companheiro, o meu ponto de luz numa meninice que foi complicada, era o colo onde eu encontrava o mimo que não recebia da minha mãe, na juventude era a ele que confiava os meus segredos os meus amores e desamores, foi a ele que entreguei muitas das minhas lágrimas e para a minha profunda tristeza ele tinha sempre um gesto, uma palavra.
O meu pai não era católico, a família seguiu-lhe os passos, eu incluída, mas chegou a juventude, chegou a rebeldia, chegaram os porques e os porquês, eu queria resposta para tudo. Vieram os desentendimentos, as discussões quase diárias e os confrontos e inevitavelmente o dia em que eu disse "Basta!"
Escrevi uma carta e expulsei-me a mim própria, uma vez que era da praxe o líder da comunidade expulsar os pecadores... eu não lhe quis dar esse prazer e saí pelo meu pé e pela porta da frente!
Nesse dia morri para o meu pai, uma vez que mandam as regras daquela seita que quem sai nunca mais poderá ter laços com quem fica e isso inclui separar pais de filhos e filhos de pais, os laços familiares não interessam, fala mais alto o fanatismo.
De uma só vez perdi o enfermeiro/ médico, o companheiro de todas as horas, o amigo, mas acima de tudo, perdi-te pai. 

Sei que não falas comigo, sei que não vais ler isto, mas gostava apenas de te dizer que tenho saudades das nossas conversas que desde que não incluíssem religião eram amenas, agradáveis e divertidas.
Tenho saudades do passar das tuas mãos ásperas no meu cabelo, tenho saudades de fazer cavalinho no teu joelho, tenho saudades de quando me dizias "porque choras minha filha, porque não acreditas no teu pai se te digo que és linda, filha..." nunca mais acreditei em ninguém, e aviso-te já que estou zangada porque nunca mais ninguém me veio atracar os cobertores a meio da noite como tu fazias, nunca mais as bolas de berlim foram cremosas, doces e fofas como as que tu compravas só para mim ao domingo e nunca mais os passeios na Ribeira tiveram cheiro a tremoços e azeitonas no fim das tardes de Verão...tenho saudades tuas paizinho.

Suricate



 

7 comentários:

  1. Ui, este desafio promete lágrimas....ai promete sim e muitas. Estou a ver que a tendência está para o que marcou e mais doeu na infância e isso transpõe-se para esta fase como um grande fardo.
    Gostei muito do texto, é muito sentido e com saudade, de quem é?
    Beijocas nossas ;)

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    Respostas
    1. É meu Karochinha:)

      jinhoooossssss

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    2. Suri, deixa-me que aqui te escreva que te considero uma Mulher (apenas pelo que conheço da tua escrita e isso revela muito) como poucas e cheia de uma garra e força que é raro. As experiências que a Vida nos oferece deveriam servir par anos enriquecer mas também acredito que muitas delas nos empobrecem a alma e ler estes teus dois testemunhos, tão sentidos ainda me deixa mais convicta que tu és uma pessoa muito rica, com uma alma linda!
      Beijocas e desejos de dias, sempre muitos dias, felizes!

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  2. Uma guerreira a Suri, perder fisicamente dói muito, mas perder quem continua vivo não é uma dor menor, é uma ferida sempre aberta, nem imagino a dor... A Suri podia ter escolhido revoltar-se, mas linda como é escolheu canalizar todas as suas energias, todo o seu amor, para ser e fazer feliz. Parabéns Suri. <3

    Beijos Mel e Suri, duas guerreiras de coração doce <3

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  3. Um beijinho Suri. Não imagino como seja viver com uma dor assim, mas espero que sejas sempre muito feliz.
    beijinho**

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  4. Existem pessoas assim com histórias de vida tão tristes e que no entanto não perderam a maior capacidade de todas, a capacidade de amar e de dar amor. Bj grande Suri. ;)

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